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domingo, 31 de agosto de 2014

Lanterna dos afogados



Quando tá escuro
E ninguém te ouve
Quando chega a noite
E você pode chorar

Há uma luz no túnel 
Dos desesperados
Há um cais de porto
Pra quem precisa chegar

Eu tô na lanterna dos afogados
Eu tô te esperando
Vê se não vai demorar

Uma noite longa
Pra uma vida curta
Mas já não me importa
Basta poder te ajudar
E são tantas marcas
Que já fazem parte
Do que eu sou agora
Mas ainda sei me virar

Eu tô na lanterna dos afogados
Eu tô te esperando
Vê se não vai demorar

Uma noite longa
Pra uma vida curta
Mas já não me importa
Basta poder te ajudar
Eu tô na lanterna dos afogados
Eu tô te esperando
Vê se não vai demorar

Paralamas do sucesso

Você se lembra

Você se lembra




Você se Lembra

Geraldo Azevedo

Entre as estrelas do meu drama 
Você já foi meu anjo azul 
Chegamos num final feliz 
Na tela prateada da ilusão

Na realidade onde está você 
Em que cidade você mora 
Em que paisagem em que país 
Me diz em que lugar, cadê você

Você se lembra 
Torrentes de paixão 
Ouvir nossa canção 
Sonhar em Casablanca 
E se perder no labirinto 
De outra história

A caravana do deserto 
Atravessou meu coração 
E eu fui chorando por você 
Até os sete mares do sertão

Você se lembra...


Quase um segundo

Quase Um Segundo

Cazuza

Eu queria ver no escuro do mundo
Aonde está o que você quer
Pra me transformar no que te agrada
No que me faça ver

Quais são as cores e as coisas pra te prender
Eu tive um sonho ruim e acordei chorando
Por isso eu te liguei

Será que você ainda pensa em mim?
Será que você ainda pensa?

Às vezes te odeio por quase um segundo
Depois te amo mais
Teus pelos, teu gosto, teu rosto, tudo
Tudo que não me deixa em paz

Quais são as cores e as coisas pra te prender?
Eu tive um sonho ruim e acordei chorando
Por isso eu te liguei

Será que você ainda pensa em mim?
Será que você ainda pensa?

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Tudo




Tudo me é uma dança em que procuro
A posição ideal,
Seguindo o fio dum sonhar obscuro
Onde invento o real.
À minha volta sinto naufragar
Tantos gestos perdidos
Mas a alma, dispersa nos sentidos,
Sobe os degraus do ar…


Sophia de Mello Breyner Andresen
in POESIA,

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

O amor é contagioso

“Não te amo como se fosses rosa de sal,

topázio, ou flechas de cravos que atiram chamas.

Te amo como se amam certas coisas escuras,

secretamente, entre a sombra e a alma.

Eu te amo sem saber como, nem quando e nem onde.

Te amo simplesmente,

sem complicações nem orgulho.

Assim te amo porque não conheço outra maneira.

Tão profundamente

que a tua mão no meu peito é a minha.

Tão profundamente

que quando fecho os olhos, contigo eu sonho.

É assim que te amo

e nada mais me importa.”


Adams

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

No fundo dos teus olhos


No Fundo Dos Teus Olhos

Mafalda Veiga

Tu és a luz 
Sentida nos luares do firmamento 
Tu és o fogo 
Que nos acende a alma num momento 
Dentro da noite 
Há uma chama mágica a brilhar 
Que te enfeitiça 
E ilumina o teu corpo a dançar

Tu és a côr 
Por dentro das palavras que navegam 
És o calor 
De tudo o que te dão e que te negam 
O brilho intenso de um olhar 
Um sol que se acendeu 
A pulsação do mundo 
A vida inteira 
A desejar o que se perdeu

À procura 
À procura de um sonho 
À procura 
À procura de ti 
Há um mar escondido 
No fundo dos teus olhos 
Que te leva 
Pra tão longe daqui

Os dias

Mafalda Veiga

No meu quarto há uma janela
Sobre um pedaço do mundo
Na rua estreita
Os prédios seguram o céu

As caras de sempre
Têm dias sorridente e outros sisudos
Porque de alegria e de tristeza
Cada um tem um pedaço que é o seu

No meu quarto, pela janela,
O sol entra em geometria
Faz desenhos no chão
Pinta-me luas na pele

Rasga sombras teimosas, escondidas,
A reclamar poesia
E voa das mãos para a rua aviões de papel

Há dias que sopram
Os dias que vão
Levantam asas
Ou ficam em pedaços pelo chão
Há dias perdidos
E outros sem fim
A colar cada pedaço 
Do mundo que as partiu dentro de mim

Nesta rua estreita 
Os prédios escondem o resto de escuro
Os caminhos da noite, mais longe,
No resto do céu

Há em cada olhar
A vaga certeza do mesmo rio ao fundo
Mas por dentro do peito
Cada um traz um horizonte que é o seu

O lume


O Lume
Mafalda Veiga
Vai caminhando desamarrado
Dos nós e laços que o mundo faz
Vai abraçando desenleado
De outros abraços que a vida dá

Vai-te encontrando na água e no lume
Na terra quente até perder
O medo, o medo levanta muros
E ergue bandeiras pra nos deter

Não percas tempo,
O tempo corre
Só quando dói é devagar
E dá-te ao vento
Como um veleiro
Solto no mais alto mar

Liberta o grito que trazes dentro
E a coragem e o amor
Mesmo que seja só um momento
Mesmo que traga alguma dor
Só isso faz brilhar o lume
Que hás-de levar até ao fim
E esse lume já ninguém pode
Nunca apagar dentro de ti

Não percas tempo
O tempo corre
Só quando dói é devagar
E dá-te ao vento
Como um veleiro
Solto no mais alto mar



quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Prece

Clarice Lispector
(Ucrânia, 1925 - Brasil, 1977)
Prece
Alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à
minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já
estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar énão morrer, que a
entrega de si mesmo não significa a morte, faze com que eu sinta uma alegria
modesta e diária, faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta
seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que me lembre de que
também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no
entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o
mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu
mesma também incompreensível, então é que há uma conexão entre esse
mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós
enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para eu vivacom alegria o pão
que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim
mesma, pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu
perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana
amada para apertar a minha, amém.

Meu Deus me dê coragem...





Clarice Lispector
(Ucrânia, 1925 - Brasil, 1977)
Meu Deus, me dê coragem...
Meu Deus, me dê a coragem
de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites,
todos vazios da tua presença
Me dê a coragem de considerar esse vazio
como uma plenitude
Faça com que eu seja a tua amante humilde
entrelaçada a ti em êxtase
Faça com que eu possa falar
com este vazio tremendo
e receber como resposta
o amor materno que nutre e embala
Faça com que eu tenha a coragem de te amar,
sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo
Faça com que a solidão não me destrua
Faça com que minha solidão
me sirva de companhia
Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar
Faça com que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir como se estivesse
plena de tudo
Receba em teus braços o meu pecado de pensar

eu sei


Clarice Lispector
(Ucrânia, 1925 - Brasil, 1977)
Eu sei mas não devia
Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra
vista que não as janelas ao redor.
E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora.
E porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas.
E porque não abre as cortinas logo se acostuma a acender cedo a luz.
E a medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar,esquece a
amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora.
A tomar o café correndo porque está atrasado.
A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem.
A comer sanduiche porque não dá para almoçar.
A sair do trabalho porque já e noite.
A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso
ir.
A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta.
A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita.
E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar.
E a pagar mais do que as coisas valem.
E a saber que cada vez pagará mais.
E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar
nas filas em que se cobra.
A gente se acostuma a poluição.
As salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro.
A luz artificial de ligeiro tremor.
Ao choque que os olhos levam na luz natural.
As bactérias de água potavel.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer.
Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um
ressentimento ali, uma revolta acolá.
Se a praia está contaminada a gente molha só os pés e sua no resto do corpo.
Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o
pescoço.
Se o trabalho está duro a gente se consola pensando nofim de semana.
E se no fim de semana não há muito o que fazer a gentevai dormir cedo e
ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, parapreservar a pele.
Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida.
Que aos poucos se gasta, e que gasta de tanto se acostumar, e se perde de si
mesma.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Por te rever

Por Te Rever

Mafalda Veiga

Quisera roubar-te essas palavras e morrer
Trazer-te assim até ao fim do que eu puder
E começar um dia mais eternamente
Por te rever, só
Pudesse eu guardar-te nos sentidos e na voz
E descobrir o que será de nós
E demorar um dia mais eternamente
Por te rever, só
Quisera a ternura, calmaria azul do mar
O riso o amor o gosto a sal o sol do olhar
E um lugar pra me espraiar eternamente
Por te rever, só
Pudesse eu ser tempo a respirar no teu abraço
Adormecer e abandonar-me de cansaço
Quisera assim perder-me em mim eternamente
Por te rever, só 


Velho

Parado e atento à raiva do silêncio 
de um relógio partido e gasto pelo tempo 
estava um velho sentado no banco de um jardim
a recordar fragmentos do passado

na telefonia tocava uma velha canção 
e um jovem cantor falava da solidão 
que sabes tu do canto de estar só assim 
só e abandonado como o velho do jardim?

o olhar triste e cansado procurando alguém 
e a gente passa ao seu lado a olhá-lo com desdém 
sabes eu acho que todos fogem de ti pra não ver 
a imagem da solidão que irão viver 
quando forem como tu 
um velho sentado num jardim

passam os dias e sentes que és um perdedor 
já não consegues saber o que tem ou não valor 
o teu caminho parece estar mesmo a chegar ao fim 
pra dares lugar a outro no teu banco do jardim

o olhar triste e cansado procurando alguém 
e a gente passa ao seu lado a olhá-lo com desdém 
sabes eu acho que todos fogem de ti pra não ver 
a imagem da solidão que irão viver 
quando forem como tu 
um resto de tudo o que existiu 
quando forem como tu 
um velho sentado num jardim


segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Cada lugar teu

Cada Lugar Teu

Mafalda Veiga

Sei de cor cada lugar teu
Atado em mim, a cada lugar meu
Tento entender o rumo que a vida nos faz tomar
Tento esquecer a mágoa
Guardar só o que é bom de guardar

Pensa em mim protege o que eu te dou
Eu penso em ti e dou-te o que de melhor eu sou
Sem ter defesas que me façam falhar
Nesse lugar mais dentro
Onde só chega quem não tem medo de naufragar

Fica em mim que hoje o tempo dói
Como se arrancassem tudo o que já foi
E até o que virá e até o que eu sonhei
Diz-me que vais guardar e abraçar
Tudo o que eu te dei

Mesmo que a vida mude os nossos sentidos
E o mundo nos leve pra longe de nós
E que um dia o tempo pareça perdido
E tudo se desfaça num gesto só

Eu Vou guardar cada lugar teu
Ancorado em cada lugar meu
E hoje apenas isso me faz acreditar
Que eu vou chegar contigo
Onde só chega quem não tem medo de naufragar

Mesmo que a vida mude os nossos sentidos
E o mundo nos leve pra longe de nós
E que um dia o tempo pareça perdido
E tudo se desfaça num gesto só

Eu Vou guardar cada lugar teu
Atado em cada lugar meu
E hoje apenas isso me faz acreditar
Que eu vou chegar contigo
Onde só chega quem não tem medo de naufragar

Vestígios de ti

Vestigios De Ti

Mafalda Veiga

Os meus discos no chão
Os copos vazios
Vestígios da noite
As palavras perdidas
O calor e o frio

O meu corpo no chão
Um livro que eu li
O silêncio e a pele
As palavras sentidas
Os vestígios de ti

E o mundo e a rua
Despidos no vento
À espera de sentir o mar
Numa vaga de espuma
Em sentidos guardados
No fundo do olhar

As revistas no chão
Os copos vazios
Vestígios do tempo
As palavras trocadas
O calor e o frio

Cada gesto que abraça
E um filme que eu vi
O que fica marcado
E já nunca se afasta
Os vestígios de ti

E o mundo e a rua
Despidos no vento
À espera de sentir o mar
Numa vaga de espuma
Em sentidos guardados
No fundo do olhar

Só tu sabes(o que ainda me seduz)

Só Tu Sabes (o que ainda me seduz)

Mafalda Veiga
 
Só um gesto
Abre um sulco no frio
Rasga o fundo
Toca no abismo e no vazio
A luz da lua
Voa sem deixar nunca
De sentir o chão
E desfaz a sombra
Que esconde o que resta
De algum sonho vão

Tantos dias
Que pouco podem mudar
Quando os muros
Não deixam ver onde nasce o mar
A luz do mundo
Vem de dentro de quem se perde
Alguma vez
A luz da noite
Vem do fundo do olhar
De quem não a quer prender

Só tu sabes o que ainda te seduz
Só tu sentes o que poderá ser
Que te rasga, que te acende
E desata o nó
Para te deixar correr

Os mundos
Que se escondem em ti
Vagabundos
Que tu não deixas nunca partir
Sair do labirinto
Escapar às emboscadas da razão
Sentir bater o vento
E andar na corda bamba da solidão

Só tu sabes o que ainda te seduz
Só tu sentes o que poderá ser
Que te rasga, que te acende
E desata o nó
Para te deixar correr

No rastro do sol


Mafalda Veiga

Duas luas no céu e duas canções
Dois olhares que se cruzam a procurar
Um sol um luar
E todos os lugares onde a luz se pode abraçar

Doze luas em ti e sete marés
Sete barcos navegam a procurar
Um porto uma praia
Talvez no fim do mar onde alguém nos venha esperar

Vem comigo no rasto de sol
Eu vou contigo
Vem comigo do outro lado das muralhas
Eu vou contigo

Duas luas no céu na palma da mão
Dois olhares que se entregam até ao fim
Do corpo e da alma
Em todos os lugares onde o mundo me fala de ti

À tua volta há luz de sete luares
Sete barcos navegam para encontrar
Um fogo um calor
Talvez no fim de tudo haja força pra recomeçar
Vem comigo no rasto de sol
Eu vou contigo
Vem comigo do outro lado das muralhas
Eu vou contigo

Duas luas no céu e duas canções
Dois olhares que se cruzam a procurar
Um sol um luar
E todos os lugares onde a luz se pode tocar

Vem comigo no rasto de sol
Eu vou contigo
Vem comigo do outro lado das muralhas
Eu vou contigo

Cúmplices

Cúmplices

Mafalda Veiga

A noite vem às vezes tão perdida
E quase nada parece bater certo
Há qualquer coisa em nos inquieta e ferida
E tudo que era fundo fica perto

Nem sempre o chão da alma é seguro
Nem sempre o tempo cura qualquer dor
E o sabor a fim do mar que vem do escuro
É tantas vezes o que resta do calor

Se eu fosse a tua pele
Se tu fosses o meu caminho
Se nenhum de nós se sentisse nunca sozinho

Trocamos as palavras mais escondidas
E só a noite arranca sem doer
Seremos cúmplices o resto da vida
Ou talvez só até amanhecer

Fica tão fácil entregar a alma
A quem nos traga um sopro do deserto
Olhar onde a distância nunca acalma
Esperando o que vier de peito aberto

Se eu fosse a tua pele
Se tu fosses o meu caminho
Se nenhum de nós se sentisse nunca sozinho


Era uma vez um pensamento teu

Era uma vez um pensamento teu

Mafalda Veiga

Era vez um pensamento teu
Quase podia ser segredo meu
E teu
Era quem sabe um tempo de inventar
Subir o teu corpo
Cair do teu sonho
E ficar em nós

Era uma vez um medo que voou
Que se fez asa, sopro, ar
Nunca mais voltou 
E eu sem saber porquê fui atrás
E ainda o vi
Esconder-se de ti
Era talvez um tempo de te amar
Era talvez um tempo de sentir

Era uma vez um pensamento meu
Quase podia ser segredo teu
E meu
Era quem sabe um tempo de inventar
Subires o meu corpo
Caíres do meu sonho
E ficares em nós

Era uma vez um sonho que não sei
Que se fez asa, sopro, ar
Quase lhe toquei
E a pressentir porquê fui atrás
E ainda o vi
A esconder-se em mim
Era talvez um tempo pra te dar
Era talvez um tempo de te amar

O tempo que não foi tempo não passou
O sonho que se fez pele e se guardou 
aqui ficou
Como se fosse sopro, asa, ar, escondeu-se em nós
E no teu olhar
Fica pra sempre um tempo de te amar
Fica pra sempre tanto do que sou

domingo, 3 de agosto de 2014

Você é tão única e eu sou seu par


VOCÊ É TÃO ÚNICA E EU SOU SEU PAR


Fabrício Carpinejar

Você é tão única que mesmo que soltasse um grito não teria eco. Você é tão única que quando ri já está respondendo. Você é tão única que quando dança se aproxima de meu ouvido para estalar rimas, e tem um prazer desmedido de me arrepiar com a ponta da língua. Você é tão única que me prende com os joelhos como quem dá as mãos. Você é tão única que diz que me quer apenas mordendo os lábios. Você é tão única que deseje que a olhe enquanto gozo. Você é tão única que toda noite é uma festa, nada de lavar louça, usa todos os copos de casa para então começar a usar as xícaras. Você é tão única que sofre de pressa para ocupar a casa com o nosso cheiro, e me enlaça na sala, na cozinha, no escritório, onde for: a cama está em sua nudez. Você é tão única que só confia em mim para se despir (assim como confia no espelho para se vestir). Você é tão única que me abraça de costas, como se eu fosse um rochedo ou seu casaco mais próximo. Você é tão única que se orgulha de nossas bobagens. Você é tão única que não espalha sua sombra na parede. Você é tão única que enfileira seus sapatos em jardineira de porta. Você é tão única que não há tempo de sentir ciúme porque passa o tempo inteiro comigo. Você é tão única que escrevo para impressioná-la. Você é tão única que demonstra admiração cuidando de mim. Você é tão única que não adianta explicá-la, tem a força de um segredo. Você é tão única que a saudade vem antes da felicidade. Você é tão única que desfaz mágoa beijando o meu pescoço. Você é tão única que não deixa nada estragar o silêncio, protege a chama de meu rosto com seus dedos, acaricia a barba por dentro. Você é tão única que liberdade é esperança de mais um dia junto, que a esperança é a liberdade de mais uma noite junto. Você é tão única que pronuncia telhado e os pássaros pousam, pronuncia verão e o mar ruge, pronuncia árvore e temos frutos. Você é tão única que acerta até com os atos falhos. Você é tão única que desaparecem os problemas e as urgências. Você é tão única que anda devagar para que enxergue vindo, o chão é uma escada rolante.

Quando amo você, tenho uma única certeza: de que foi feita para meu corpo.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

O auto Retrato

O auto Retrato

No retrato que me faço
- traço a traço -
às vezes me pinto nuvem,
às vezes me pinto árvore...
às vezes me pinto coisas
de que nem há mais lembrança...
ou coisas que não existem
mas que um dia existirão...
e, desta lida, em que busco
- pouco a pouco -
minha eterna semelhança,
no final, que restará?
Um desenho de criança...
Terminado por um louco!

Mario Quintana

tentar esquecer-me

Tenta esquecer-me

Tenta esquecer-me...
Ser lembrado é como evocar
Um fantasma... Deixa-me ser o que sou,
O que sempre fui, um rio que vai fluindo...
Em vão, em minhas margens cantarão as horas,
Me recamarei de estrelas como um manto real,
Me bordarei de nuvens e de asas,
Às vezes virão a mim as crianças banhar-se...
Um espelho não guarda as coisas refletidas!
E o meu destino é seguir... é seguir para o Mar,
As imagens perdendo no caminho...
Deixa-me fluir, passar, cantar...
Toda a tristeza dos rios
É não poder parar!

Mario Quintana

Mario Quintana

Eu queria trazer-te uns versos muito lindos
colhidos no mais íntimo de mim...
Suas palavras
seriam as mais simples do mundo,
porém não sei que luz as iluminaria
que terias de fechar teus olhos para as ouvir...
Sim! Uma luz que viria de dentro delas,
como essa que acende inesperadas cores
nas lanternas chinesas de papel!
Trago-te palavras, apenas... e que estão escritas
do lado de fora do papel... Não sei, eu nunca soube o que dizer-te
e este poema vai morrendo, ardente e puro, ao vento
da Poesia...
como
uma pobre lanterna que incendiou!

Mario Quintana
A vida é um incêndio: nela
dançamos, salamandras mágicas
Que importa restarem cinzas
se a chama foi bela e alta?
Em meio aos toros que desabam,
cantemos a canção das chamas!
Cantemos a canção da vida,
na própria luz consumida...

Mario Quintana

Presença

PRESENÇA

É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale
sutilmente, no ar, a trevo machucado,
as folhas de alecrim desde há muito guardadas
não se sabe por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu sentir
como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.

Mario Quintana