songs

songs

sábado, 19 de outubro de 2013

O sacrifício do vinho





    O SACRIFÍCIO DO VINHO

    Paris
    Contra o crepúsculo 
    O vinho assoma, exulta, sobreleva 
    Muda o cristal da tarde em rubra pompa 
    Ganha som, ganha sangue, ganha seios 
    Contra o crepúsculo o vinho 
    Menstrua a tarde. 

    Ah, eu quero beber do vinho em grandes haustos 
    Eu quero os longos dedos líquidos 
    Sobre meus olhos, eu quero 
    A úmida língua... 

    O céu da minha boca 
    É uma cúpula imensa para a acústica 
    Do vinho, e seu eco de púrpura... 
    O cantochão do vinho 
    Cresce, vermelho, entre muralhas súbitas 
    Carregado de incenso e paciência. 
    As sinetas litúrgicas 
    Erguern a taça ardente contra a tarde 
    E o vinho, transubstanciado, bate asas 
    Voa para o poente 
    O vinho... 

    Uma coisa é o vinho branco 
    O primeiro vinho, linfa da aurora impúbere 
    Sobre a morte dos peixes. 
    Mas contra a noite ei-lo que se levanta 
    Varado pelas setas do poente 
    Transverberado, o vinho... 
    E o seu sangue se espalha pelas ruas 
    Inunda as casas, pinta os muros, fere 
    As serpentes do tédio; dentro 
    Da noite o vinho 
    Luta como um Laocoonte 
    O vinho... 

    Ah, eu quero beijar a boca moribunda 
    Fechar os olhos pânicos 
    Beber a áspera morte 
    Do vinho...


Nenhum comentário:

Postar um comentário