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terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Tereza Brinco

Num rasgo de olhar

chove neste segundo.
também chove neste segundo dia
de um inverno frio.
chove lá fora e nos corações da gente que sente
o soçobrar da vida
a inevitabilidade da morte como a caducidade das folhas
apesar da esperança bater não sei onde
com promessas de renascimento.
tardias as promessas como vagaroso o tempo da chuva.
longe o arauto primaveril de paixões fulgurantes 
e corações ruidosos de deslumbres.
para lá do tempo fica o tempo em que sonhámos 
um olhar apaixonado como uma rosa vermelha, 
um abraço forte como um abraço
e tão grande como o mundo que não sabíamos 
mas adivinhávamos algures. 
talvez no coração.

chove neste segundo
e neste segundo a morte espreita a vida
e também neste segundo invade-nos a esperança
de ver o sol num horizonte limpo
entre o céu e a terra
e de sentir o abraço forte como um abraço
e um beijo quente como um beijo
e uma lágrima num sorriso.

chove 
e neste segundo de chuva torrencial
vem-me à memória tudo o que não demos, 
o abraço que perdemos,
o beijo que tememos, 
as primaveras que olvidámos e os invernos 
em que chamas incendiaram lareiras
e nós, com medo do mundo, não nos deixámos arder.
ficámos na saudade do que não foi.

contudo, chove neste segundo
cá dentro e lá fora...
contudo, não mais será saudade por não ser
em cada segundo o que deverá ser em cada
segundo.

...e o mundo continua a rota do tempo
apesar da morte anunciada
apesar da vida renovada 
também ela, pelo tempo.

Tereza Brinco de Oliveira

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